Quando da formação do Mercosul,
em 1991, o bloco econômico que se embrionava parecia um novo capítulo na
relações políticas, sócio-culturais, mas principalmente econômicas no nosso
continente e parecia que, enfim, o Brasil mudava sua posição “de costas” para a
América do Sul e de antagonismo com a Argentina. Essa época foi de mudanças
dramáticas no cenário geopolítico mundial, com a derrocada de quase todos os
governos comunistas, e esfacelamento de alguns países, como Alemanha Oriental,
unificada à Alemanha Ocidental, Tchecoslováquia, a brutal desagregação da
Iugoslávia e o melancólico fim da União Soviética.
O Brasil parecia na vanguarda
geopolítica, assim como os Estados Unidos, que apressaram a adesão do México ao
seu NAFTA com o Canadá, ou Alemanha e França liderando um aprofundamento da
integração na Europa, com o Tratado de Maastrich e até mesmo a Rússia, que
abraçando o capitalismo, tratou de manter sob sua órbita econômica, várias
antigas repúblicas do período soviético, através da CEI.
Parecia. O transcorrer da década
de 1990 ensejou ações tímidas do Brasil em direção à integração com seus
parceiros “mercosulinos”. Dois fatores obstaculizavam: As crises financeiras e
o protecionismo argentino. O ápice desse período foi em 1999, quando o governo
portenho decretou moratória, depois de uma aguda crise política que resultou em
uma verdadeira “dança das cadeiras” com cinco presidentes da república se
sucedendo em menos de um mês.
O início do novo milênio trazia
esperanças de um novo arranjo, com novos governos, com forte apelo popular, no
Brasil e na Argentina. Tanto que, começaram as negociações para a adesão da
Venezuela ao Bloco e Bolívia, Peru, Equador e Chile tornaram-se
membros-associados, e um Parlamento foi instalado.
O Parlamento do Mercosul, com
sede em Montevidéu, instalado em dezembro de 2005 teria inicialmente, 18
representantes vindos de cada um dos congressos nacionais dos quatro países-membros, ou seja, nessa
primeira fase, sua representação seria paritária. Seus substitutos seriam,
supostamente, eleitos por voto direto, e com representação proporcional ao
tamanho das populações dos países que representassem. O Parlamento do Mercosul
seria uma caixa de ressonância dos desejos, anseios, necessidades e das ideias
das populações dos quatro países.
Passamos por duas eleições gerais
desde então e ainda temos deputados federais e senadores que, além das suas
funções de representantes de seus estados junto ao congresso brasileiro,
acumulam a função de representantes dos interesses brasileiros no Parlamento do
Mercosul, e pior, sem serem escolhidos pelo povo para isso.
De certo, o Brasil precisou
negociar com os outros “sócios” do bloco, pois, naturalmente, haveria uma
enorme disparidade entre o número de parlamentares de cada país, uma vez que o
Brasil possui quase quatro vezes a população Argentina, Uruguai e Paraguai
somadas.
Pois bem, se o Parlamento está
instalado desde 2005, e diversos congressistas de vários partidos políticos,
por ele passaram, qual a dificuldade de elaboração de um plano de atuação
parlamentar por parte dos partidos políticos? Ao percorrer os sites de todos os
partidos brasileiros que possuem esse canal de informação não existe uma única linha,
um mísero link, que destaque a
atuação dos parlamentares do partido em Montevidéu, ou mesmo que informe os
planos, ou intenções que o partido tem acerca da defesa de interesses
brasileiros no bloco.
Falar então em formação de blocos
parlamentares supranacionais parece fora de propósito.
Esse imenso nada faz par com o
silêncio retumbante quando se questiona qualquer partido político diretamente.
Simplesmente não se obtêm respostas, seja quando se interpela à direção
partidária, seja quando se procura as fundações e institutos de pesquisa
política, que os partidos são obrigados a manter. O mais comum é não conseguir
nenhuma resposta. Raras vezes, seu pedido é encaminhado ao parlamentar que
estiver, naquele momento, indicado para o Parlamento e aí, ocorre a fulanização
do processo, quando esse parlamentar envia o que ele produziu, o que ele apresentou,
o que ele defendeu.
O que é essencial aqui é
conhecermos o que os nossos partidos políticos pretendem em relação ao
Mercosul, pois serão esses partidos políticos que determinarão a sequencia dos
candidatos numa lista nacional pré-ordenada, como consta no Projeto de Lei que regulamenta
a eleição direta para o Parlamento do Mercosul. Estaremos à mercê dos partidos,
os mesmos que não possuem propostas, projetos, informações ou transparência as
suas ações para o Mercosul. Afinal, quais os critérios usados para a indicação dos
atuais representantes brasileiros no Parlamento do Mercosul? Essa falta de propostas
e de discurso permeia todas as agremiações partidárias, desde os partidos da
esquerda mais radical, passando pelos de centro-esquerda, centro, centro-direita,
até os da direita mais selvagem.
Estudo as relações de integração
do Mercosul desde 1996, e busco fazer comparações com outros blocos econômicos.
Aqueles que são mais fortes institucionalmente, são aqueles que têm espaços de
representação popular fortes e relevantes. O Parlamento do Mercosul,
infelizmente, está longe desses predicados atualmente. À começar pela sua
estrutura, que não lhe confere poder de aprovação ou regulamentação de acordos,
cartas e tratados, passando pela atuação dos parlamentares, normalmente
medíocre, e atingindo o “fundo do poço” com a absoluta inoperância dos partidos
políticos na discussão de propostas e projetos para o bloco.
Seremos obrigados a participarmos
dessa eleição. Mais do que uma obrigação, o direito ao voto foi uma conquista
da qual não podemos prescindir, e a nossa história recente já nos deu exemplos
de como as coisas se encaminham quando esse direito é negado. Não podemos ser
negligentes como a democracia nem permitir que sejam e os partidos políticos tem
se mostrado assim aos eleitores/cidadãos. Não podemos deixar que a democracia
representativa continue a ser desacreditada, sob pena de não conseguirmos
construir uma efetiva democracia participativa.
Rogo à todas as tendências
partidárias dentro de todos os partidos políticos que organizem propostas e
projetos, para a atuação parlamentar de nossos futuros representantes no
Parlamento do Mercosul, em Montevidéu, para que possamos dinamizar os processos
de integração de infraestrutura de transportes, de energia, de sistemas
bancários, de regras aduaneiras, de regras trabalhistas, que repercutirão em
integração e desenvolvimento econômico e em políticas comuns de educação,
saúde, cultura, lazer que certamente trarão um novo olhar e um novo agir dos
cidadãos mercosulinos e sul-americanos, irmanados, não sob um mesmo governo,
como buscou Bolívar, mas sob um mesmo ideal.
Esse artigo foi publicado no Blog do Diário de São Paulo http://www.diariosp.com.br/blog/detalhe/11907 e no Fórum do Leitor, do site do Estadão http://www.estadao.com.br/noticias/geral,forum-dos-leitores,927647,0.htm